Warren Buffett e a Análise de Balanços

Warren Buffett e a Análise de Balanços

Entenda como ler demonstrações financeiras e saiba o que estudiosos dos métodos de Warren Buffett têm a dizer sobre a escolha de ações de empresas excepcionais.

Depois de alguns meses sem ler sobre análise fundamentalista (o último livro nessa linha foi A Fórmula Mágica de Joel Greenblatt para Bater o Mercado de Ações), achei que era um bom momento de aprender mais sobre leitura de balanços.

Mary Buffett (ex-nora de Warren Buffett) e David Clark, especialistas nos métodos de investimento do bilionário, explicam os itens mais pertinentes das demonstrações financeiras, o que já faz de Warren Buffett e a análise de balanços uma ótima obra para consultar como referência.

Mas acho que o melhor está nas explicações de como Warren Buffett vasculharia os resultados das companhias em busca de vantagens competitivas duradouras. E é justamente nessas informações essenciais aos que desejam investir em ações no longo prazo que quero focar nesta resenha. Vamos lá!

Itens gerais

Antes de olharmos as demonstrações financeiras e os balanços em nossa pesquisa por boas empresas, vamos prestar atenção nestes dois pontos mais amplos.

Primeiro filtro

A primeira característica a avaliar tem a ver com o negócio em si. Companhias com um produto ou serviço exclusivo ou empresas que lucram bem oferecendo produtos/serviços a baixo custo são boas opções.

Consistência

Uma empresa que consegue se manter competitiva sem precisar criar novos produtos ou serviços é um ótimo exemplo de consistência, afinal, ela é capaz de continuar relevante sem ter que investir constantemente em mudanças no que oferece aos clientes.

Mas não é só nesse tipo de consistência que devemos prestar atenção. Também é fundamental que ao longo dos anos a companhia conte com pouco endividamento, não dependa sempre de grandes investimentos em pesquisa e desenvolvimento, dê lucro e apresente lucro crescente.

Demonstrativo do Resultado do Exercício (DRE)

O DRE é um documento com informações sobre os resultados da empresa, relativos a um determinado período. Quando divulgado, geralmente se refere ao último trimestre.

Vejamos alguns dos itens mais importantes.

Receita

A receita em si não diz muita coisa porque, se a empresa tiver muitos gastos, seus resultados serão ruins. Para que o negócio ganhe mais dinheiro, também é preciso ter gastos controlados/responsáveis.

Lucro bruto

Lucro bruto é a receita (dinheiro que a empresa faturou) menos o custo dos bens vendidos (quanto a empresa gastou com matéria-prima e mão-de-obra para produzir seus produtos ou quanto ela gastou na compra de produtos para depois revendê-los).

Caso a empresa forneça serviços, o lucro bruto será a receita menos o custo de vendas.

Despesas administrativas, despesas com marketing e vendas, juros e depreciação não entram no custo dos bens vendidos.

A partir daí, conseguimos calcular a margem de lucro bruta, que é o lucro bruto dividido pela receita.

De acordo com os autores, Buffett gosta de empresas cuja margem de lucro bruta é elevada e se mantém alta com o passar dos anos (avaliar se permaneceu consistente nos últimos 10 anos). Eles explicam que, em geral, empresas com vantagens competitivas têm margem de lucro bruta de 40% ou mais.

Lembrando que para conquistar o público, empresas sem vantagem competitiva costumam precisar baratear seus produtos ou serviços, o que acaba afetando as margens de lucro. Já as empresas excepcionais podem ajustar os preços de modo a manter as margens interessantes, já que um público fiel provavelmente continuará consumindo seus produtos.

Mas é claro que isso não quer dizer que a empresa será boa para sempre. É preciso monitorar para ver se ela não começará a aumentar os custos mais do que deveria.

Lucro operacional

Encontramos o lucro operacional ao subtrair do lucro bruto as despesas administrativas, despesas de vendas, despesas de marketing, depreciação e amortização, pesquisa e desenvolvimento e outros.

Despesas de vendas, gerais e administrativas (despesas VGA)

Inclui os gastos que não estão relacionados diretamente à produção.

Aqui, procuramos empresas que, balanço após balanço, apresentam consistência nas despesas VGA como percentual do lucro bruto, que seria a fórmula a seguir:

$$ \frac{despesas VGA}{lucro} \times 100 $$

Se essa porcentagem variar muito ou se for muito elevada (acima de 80%), é sinal que provavelmente a companhia pertence a um mercado muito competitivo (forte concorrência).

Então, o ideal é que esse percentual seja baixo e constante. Menos que 30% é ótimo, mas entre 30% e 80% é aceitável, de acordo com os autores.

Pesquisa e desenvolvimento

Apesar de termos visto no início que é bom evitar empresas que dependam de grandes investimentos em pesquisa e desenvolvimento, vale acrescentar que há casos em que o fruto desses gastos representam vantagem competitiva, como patentes de tecnologias.

Acontece que conforme novas tecnologias se desenvolvem, acabam por tornar as antigas obsoletas. Sem falar que um dia as patentes expiram. Sendo assim, é melhor não investir se esse tipo de despesas for constantemente muito alto.

Depreciação

É o equivalente ao desgaste de imóveis, máquinas e outros ativos.

As empresas das quais Buffett gosta deverão ter a menor despesa possível com depreciação em relação ao lucro bruto.
Então não basta olhar só para o EBITDA (Lucro Antes de Juros, Impostos, Depreciação e Amortização) porque ele pode esconder grandes gastos.

Despesa com juros

Por ser uma despesa financeira, vem depois do lucro operacional no DRE.

Aqui também vale o lema de quanto menor, melhor. Do mesmo modo, se for a uma porcentagem consistente do lucro operacional, melhor.

Assim, a preferência fica para companhias cuja despesa com juros fique inferior a 15% do lucro operacional.

Mas é claro que isso depende do mercado em que a empresa atua. Em negócios alavancados, como bancos, é normal que esse percentual seja maior — e ainda assim há empresas excelentes no setor.

Lucro antes dos impostos

Corresponde ao lucro depois de deduzidas todas as despesas, mas ainda sem considerar a dedução de impostos. Olhar para esse indicador ajuda a fazer uma comparação de lucratividade entre empresas.

Lucro líquido

É o que sobra depois de descontados da receita todos os custos, despesas e impostos.

É desejável que a empresa seja consistentemente lucrativa e que esse lucro líquido demonstre crescimento.

Como referência, vemos no livro que um indicativo de boa companhia é quando a porcentagem do lucro líquido em relação à receita se mantém acima de 20%. Por outro lado, abaixo de 10% costuma ser mau sinal.

Lucro por ação

Lucro líquido no período (geralmente os últimos 12 meses) dividido pelo número de ações em circulação da companhia.

De acordo com os autores, Buffett procura por uma tendência de alta no lucro por ação ao longo dos últimos 10 anos.

É preciso cuidado redobrado com empresas com lucro por ação que varia muito. Como a cotação dos papéis tende a acompanhar essas oscilações, os investidores podem ter a impressão que em situações de baixa no preço do papel há boas oportunidades de compra, mas as chances são grandes de que isso seja má ideia.

Balanço patrimonial

O balanço patrimonial é como uma foto das finanças da empresa. Basicamente ele mostra quanto ela tem de dinheiro, investimentos e propriedades e como anda a situação das suas dívidas.

Caixa e investimentos de curto prazo

Em termos gerais, o que queremos procurar saber aqui é se a empresa tem dinheiro guardado ou não. Se ela tiver bastante caixa e investimentos, normalmente é um bom sinal- Por outro lado, pode ser que ela tenha vendido ativos recentemente para cobrir prejuízos, o que seria algo ruim.

Se tiver pouco ou nada, estima-se que esteja em uma condição complicada.

Logo, é preciso analisar como a companhia conseguiu e como ela lida com esse dinheiro excedente.

O dinheiro veio das próprias atividades? Muitas vezes a resposta para empresas com vantagem competitiva é sim.

Está investindo no próprio negócio? Pagando dividendos? Adquirindo outras empresas? Mantendo a salvo para usar em momentos de crise?

A análise dos balanços patrimoniais dos últimos anos (no livro recomendam sete anos) ajudará a revelar isso, especialmente se virmos os ativos se acumulando consistentemente e pouca ou nenhuma dívida.

Ativo imobilizado

O item ativo imobilizado se refere a bens da empresa como móveis, máquinas, imóveis etc.

No balanço, essas propriedades são lançadas com seu valor menos a depreciação.

Segundo os autores, é importante olhar para ele porque é comum que empresas sem vantagem competitiva precisem atualizar seus equipamentos constantemente para não ficar muito distantes da concorrência, o que pode acabar aumentando o endividamento.

Já as companhias pelas quais estamos interessados no contexto do livro não precisam ter essa preocupação, deixando para renovar suas fábricas apenas conforme elas forem se depreciando.

Aqui, fica clara a importância da consistência. Negócios que têm sucesso com apenas um ou poucos produtos só gastam com renovação de tempos em tempos e não têm de ficar se adaptando periodicamente à concorrência.

Ativos intangíveis

São aqueles que não podemos tocar, como patentes e marcas. Pelo que os autores explicaram, ativos intangíveis desenvolvidos internamente na empresa não podem ser lançados no balanço.

O valor de sua marca, que é um ativo intangível importantíssimo, por exemplo, não vai aparecer no balanço.

Acontece que a própria força da marca é um fator de vantagem competitiva. A questão é que nem sempre é fácil concluir o quão valiosa é a marca, o que exigirá uma análise de outros quesitos como os que estamos estudando aqui no post.

Investimentos de longo prazo

Na parte de investimentos a longo prazo, vale a pena prestar atenção quando a empresa adquire outras empresas.

Essas aquisições também têm vantagens competitivas? Qual foi a motivação para a aquisição?

As vezes as companhias cometem erros e compram empresas pouco competitivas, que aumentam o tamanho do negócio mas efetivamente não trazem melhorias.

Ativo total

Um ponto que vale observar sobre o total de ativos de uma empresa é um indicador que ajuda a medir a eficiência da companhia no uso desses ativos. Trata-se do retorno sobre o ativo, ou Return on Asset (ROA), um coeficiente que nada mais é que o lucro líquido dividido pelo ativo total.

Por mais que um ROA maior tenda a ser melhor, vemos um alerta importante no livro, que diz que, mesmo com ROA alto, uma companhia pode ter um ativo total modesto, que a concorrência seria capaz de ultrapassar com facilidade.

Dívida de curto prazo

Agora vamos olhar especificamente para empresas do setor financeiro.

Imagine que um banco contraia dívidas de curto prazo (precisa ser paga até o ano seguinte) a uma taxa 5% ao ano e ofereça empréstimos de longo prazo aos seus clientes a uma taxa de 10% ao ano.

Tudo vai mais ou menos bem até que acontece um aumento na taxa base de juros para mais de 10% ao ano. Assim, a empresa terá dificuldades para pagar as dívidas de curto prazo.

Por isso, os autores falam que seria menos arriscado contrair dívidas no longo prazo e usar esse dinheiro para fazer empréstimos também no longo prazo.

Se para cada dólar ou real em dívidas de longo prazo a empresa tiver muitos dólares ou reais em dívidas de curto prazo, questione se o investimento não é arriscado demais.

Dívidas de longo prazo

É esperado que empresas com vantagem competitiva não precisem se endividar em excesso no longo prazo para manter o negócio rodando, afinal, são lucrativas o suficiente para bancar melhorias, comprar outras empresas e coisas do tipo.

Assim, de modo geral, queremos evitar companhias com muitas dívidas no longo prazo.

Então, vale analisar como é o histórico de endividamento da companhia nos últimos 10 anos.

Além disso, é importante analisar se o lucro líquido anual da empresa permite que ela quite sua dívida em um ou em alguns poucos anos.

Outra observação a se fazer é a quantidade e dívidas de longo prazo que estão para vencer no ano seguinte. Se esse for o caso de uma empresa que já está com dificuldades, é um forte motivo para se manter fora desse investimento.

Coeficiente de endividamento em relação ao patrimônio líquido

Se dividirmos o passivo total pelo patrimônio líquido (ativo total menos passivo total), temos o coeficiente de endividamento em relação ao patrimônio líquido. Ele ajuda a descobrir se a empresa tem usado seu próprio patrimônio para manter suas operações e investir em desenvolvimento ou se tem se endividado para isso.

Assim, é bom que esse coeficiente seja o menor possível (os autores sugerem abaixo de 0,8), mas é preciso atentar para um detalhe.

Quando a empresa faz o processo de recompra de ações, todo esse valor sai do patrimônio líquido e fica indicado como negativo no item ações em tesouraria. Por isso os autores recomendam ajustar o cálculo do coeficiente de endividamento adicionando-se o valor de ações em tesouraria ao patrimônio líquido.

Lembrando que é um bom sinal de vantagem competitiva quando companhias são reconhecidas por fazer a recompra de ações de tempos em tempos.

Lucro acumulado

Quando a empresa mantém parte do lucro líquido dentro do próprio negócio, isso é lançado no balanço como lucro acumulado.

Companhias que fazem isso com consistência tendem a apresentar vantagem competitiva, porque significa que estão crescendo (o patrimônio líquido está aumentando) ao longo dos anos.

Consequentemente, espera-se que os acionistas vejam uma valorização nas suas ações.

Retorno sobre o patrimônio líquido

O retorno sobre o patrimônio líquido, ou Return on Equity (ROE), é a divisão do lucro líquido pelo patrimônio líquido.

Um ROE alto aponta que a gestão da empresa tem feito um bom trabalho de alocação de recursos com o capital que o negócio lucra.

Se esse retorno se mantiver consistentemente alto (os exemplos de bons ROEs no livro ficam em torno de 30%) nas divulgações de balanço, é um ótimo indício de que aquela companhia tende a se valorizar.

Outro ponto que vale mencionar é que recomprar ações e mantê-las em tesouraria tem como consequência o aumento do ROE. Explico: lembra quando vimos que o valor referente à recompra de ações sai do patrimônio líquido? Pois então… Isso vai interferir no ROE porque no cálculo o lucro líquido permanece o mesmo e o patrimônio líquido diminui. Dividindo o mesmo lucro líquido por um patrimônio líquido menor, temos um ROE maior.

O mesmo é válido para o lucro por ação, que, como vimos, é o lucro líquido dividido pelo número de ações em circulação. Já que a recompra de ações diminui o número de papéis disponíveis no mercado, o nosso cálculo terá o mesmo lucro líquido dividido por um número de ações menor, resultando em um lucro por ação maior.

Quando comprar ações de empresas em que identificamos vantagens competitivas?

Se estamos a procura de empresas tão boas, provavelmente seus papéis estarão em um patamar elevado quando quisermos comprar.

Porém, boas oportunidades de compra acontecem em quedas generalizadas do mercado ou até mesmo quando uma empresa excelente comete algum erro que deixa os investidores pessimistas, gerando baixas nos preços.

Além disso, olhar o P/L (Preço / Lucro) é outro passo importante. Se ele estiver muito elevado (acima de 40, por exemplo), talvez seja um preço caro por aquele papel.


Com todas essas dicas, acho o livro uma boa pedida para quem quer estudar análise de empresas. Ele tem menos de 200 páginas, com capítulos rápidos e é muito tranquilo de ler.

Outra coisa legal é que os autores colocam parte de um DRE ou de um balanço patrimonial de exemplo no início dos capítulos (conforme pertinente). Assim fica mais fácil de entender os termos.

Fiquei curioso para conferir outros títulos de Mary Buffett e David Clark, mas antes disso ainda tem muitos livros de trading na fila!

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